Criativo da Semana: Cena Onze, 35 anos de resistência e inovação no teatro mato-grossense
Flávio Ferreira destaca a trajetória do grupo, os desafios da economia criativa em Mato Grosso e a importância das políticas públicas para a cultura.
Ana Clara Xavier | MT Criativo

Fundado em 1989, o Cena Onze Cia de Teatro surgiu como um grupo teatral em Cuiabá e, ao longo dos anos, se consolidou como uma associação cultural com forte atuação social e artística. Desde sua criação, a companhia tem se destacado por sua capacidade de adaptação, enfrentando períodos de escassez de recursos e se reinventando para manter a produção artística viva no estado.
O MT Criativo visitou o Cine Teatro Cuiabá para entrevistar o diretor artístico Flávio Ferreira, que compartilhou a trajetória do grupo e a importância do apoio institucional da Secretaria de Estado de Cultura, Esporte e Lazer de Mato Grosso (Secel-MT) na manutenção e desenvolvimento das atividades da companhia.
Uma trajetória de resistência cultural
Ao relembrar os 35 anos de história, Flávio explica que o Cena Onze nasceu como um pequeno grupo de teatro e, com o tempo, transformou-se em uma organização com foco não apenas na produção artística, mas também em ações de impacto social. Um dos marcos dessa trajetória foi a conquista da gestão do próprio Cine Teatro Cuiabá, um espaço referência para a cena cultural local.
O papel da Secel e do MT Criativo no fortalecimento do setor
Flávio destaca que o apoio da Secel-MT, especialmente por meio de programas como o MT Criativo, tem sido fundamental para o desenvolvimento de projetos culturais em Mato Grosso.
“O MT Criativo e a Secretaria de Cultura têm sido muito importantes, não só para nós, mas para todos os artistas mato-grossenses. Nós, que estamos há muitos anos na estrada, passamos por períodos de total abandono. Esse apoio é muito recente, mas extremamente necessário. Somente através de uma política pública séria e voltada para o artista como profissional é possível que esse incentivo exista”, afirma.
A mais recente montagem do grupo, o espetáculo “Mulheres da Terra”, é um exemplo desse fortalecimento. A peça contou com recursos de uma emenda parlamentar, via Secel-MT, o que possibilitou a realização de dez apresentações em diferentes pontos do estado, incluindo quilombos, assentamentos rurais e o próprio Cine Teatro Cuiabá.
De onde veio a inspiração para “Mulheres da Terra”?
A ideia do espetáculo nasceu após um período de convivência do Cena Onze com a Comissão Pastoral da Terra (CPT), quando o grupo teve contato com o livro “10 Mulheres, Muitas Vidas”, de Scheilla Gumes e Adenor Gondim.
A obra apresenta histórias reais de mulheres camponesas de diferentes regiões de Mato Grosso, como Araguaia, Baixada Cuiabana, Médio Norte e Norte. Cada personagem retratado no livro representa uma ideia-força, como superação, diálogo, união, justiça, determinação, entre outras.
Com autorização da autora, o grupo adaptou o conteúdo para os palcos. Antes da montagem, a equipe realizou visitas a assentamentos e comunidades rurais, conhecendo de perto a realidade das mulheres retratadas. Essa vivência foi essencial para a construção do roteiro e da encenação, garantindo fidelidade e respeito às histórias dessas trabalhadoras da terra.
Empreender na economia criativa: desafios e conquistas
Flávio também comentou sobre os desafios de empreender na área cultural em Mato Grosso:
“Quando começamos, não havia nenhum tipo de política pública voltada para a arte e a cultura. O apoio era exclusivamente da iniciativa privada. A mídia sempre foi positiva conosco, mas somente com esse processo de fomento público, que temos visto de forma mais sólida agora com a gestão da Secel, conseguimos alcançar um outro patamar. Nossos artistas hoje são remunerados, nossos projetos têm acompanhamento técnico e são fiscalizados. E eu considero a fiscalização fundamental para garantir a seriedade e a continuidade dos projetos.”
Formação e profissionalização: um caminho possível
Ao ser questionado sobre qual conselho daria para quem deseja trabalhar com criatividade e viver de arte em Mato Grosso, Flávio é direto:
“Estudo. Sem conhecimento, é impossível se profissionalizar na área cultural. A busca por aprendizado é o caminho para quem quer atuar com seriedade e qualidade”, finaliza.
Com uma história marcada por resistência, inovação e compromisso social, o Cena Onze segue como uma das principais referências da cena cultural mato-grossense, mostrando que, com apoio adequado e políticas públicas consistentes, é possível transformar arte em ferramenta de desenvolvimento e transformação social.